Dismenorréia: Perspectivas Atuais
Classificação/definição
Tradicionalmente, a dismenorréia (períodos menstruais dolorosos) se classifica em dismenorréia primária (dor menstrual sem patologia pélvica que começa pouco depois da menarca) ou dismenorréia secundária (dor associada com uma patologia secundária que pode começar anos depois da menarca).
A síndrome pré-menstrual (premenstrual syndrome) se refere ao humor cíclico e às mudanças de comportamento que acontecem durante os 5 dias anteriores à menstruação.
O transtorno disfórico pré-menstrual (premenstrual dysphoric) é a presença de sintomas afetivos graves durante a fase lútea do ciclo menstrual, que pode compreender depressão, ansiedade, dificuldades de concentração, mudanças de apetite, e mudanças no sono que interferem no funcionamento dentro dos ambientes de trabalho, familiar e social.
Epidemiologia
A dismenorréia afeta entre 40 e 90% das mulheres.
A dismenorréia primária é mais comum entre os 15 e 19 anos, e a partir desse momento começa a diminuir.
Entre 5 e 14% das mulheres falta regularmente à escola como conseqüência destes sintomas.
Entre 13 e 51%das mulheres faltaram à escola ou ao trabalho, pelo menos uma vez durante sua vida como conseqüência da dismenorréia.
Muitas culturas, como algumas populações mediterrâneas, muçulmanas, hindus e chinesas, ainda consideram a menstruação como tabu e impura. O que tem como conseqüências uma hesitação em informar a dor e uma falta de atenção médica.
Fatores de riscos associados
Um IMC baixo está associado com um aumento no risco de ter dismenorréia primária.
Foi feita uma associação negativa entre a dismenorréia primária e o consumo de frutas, ovos e peixe, possivelmente relacionada com o consumo de ácidos graxos ômega-3, cálcio e magnésio.
Também são importantes os determinantes psicossociais, já que se descobriu que uma saúde mental deficiente, os sintomas somatomorfos, a diminuição da habilidade para afrontar problemas, a depressão e a ansiedade são fortes determinantes da dismenorréia.
A dismenorréia primária geralmente vem associada com náuseas e vômitos, diarréia, cansaço e sensação de irritabilidade.
Muitos transtornos de dor idiopática, como a síndrome do intestino irritável (irritable bowel syndrome), a cistite intersticial (interstitial cystitis), a síndrome da bexiga dolorida (painful bladder syndrome), a vulvodínia, a dispareunia, o transtorno temporomandibular e as enxaquecas, são geralmente comórbidos com a dismenorréia primária.
A dismenorréia secundária está associada com a endometriose, a presença de um DIU, uma doença pélvica inflamatória, adenomiose, miomas e adesões uterinas ou a obstrução do colo uterino proveniente de anomalias mullerianas.
Fumar foi associado com um aumento do risco de ter dismenorréia, mas o consumo de álcool não está sistematicamente associado com o risco de ter dismenorréia.
Apresentação
A dor associada com a dismenorréia primária antecede o início do período menstrual e, geralmente, dura entre 2 e 3 dias.
A dor associada com a dismenorréia secundária pode começar entre 1 e 2 semanas antes do fluxo menstrual e durar até além da interrupção do sangramento.
A clássica dor similar à dor do parto, suprapúbica e cólica associada com a dismenorréia pode expandir-se para a região lombossacral ou para a porção anterior da coxa.
Os sintomas viscerais associados incluem náuseas, vômitos ou diarréia.
Durante um exame, encontra-se sensibilidade proeminente no útero durante a menstruação, que em caso da dismenorréia secundária também pode estender-se fora do período de menstruação.
Patofisiologia
A etiologia exata não é clara, mas pode refletir um aumento na atividade da enzima ciclooxigenase (COX) e a atividade da sintetase prostanóide, que normalmente se ativam no final da fase lútea mediante a liberação da inibição que a progesterona exerce na produção de ácido araquidônico.
A produção de prostaglandina endometrial tem como conseqüências o aumento das contrações uterinas e isquemia miometrial relativa.
Também se observam padrões de contração uterina anormais e alterações no fluxo sanguíneo uterino em algumas pessoas que sofrem dismenorréia.
Também se observa somatização e capacidade deficiente para afrontar problemas associados positivamente com a intensidade da dor menstrual, o que sugere que também deveriam ser considerados fatores centrais.
Tratamentos
Usam-se medidas conservadoras, tais como antiinflamatórios não-esteroidais (non-steroidal anti-inflammatory), como terapia de primeira linha, e devem iniciar-se preferivelmente 48 horas antes do início de menstruação para diminuir o substrato da COX.
Antes de realizar uma avaliação adicional para determinar as causas da dismenorréia secundária, geralmente é realizada uma tentativa de 3 a 6 meses de terapia.
Os suplementos de vitaminas e minerais (ou seja, o óleo de peixe, a tiamina, o magnésio ou a piridoxina) também podem ser efetivos em função de pequenos estudos realizados.
A estimulação dos nervos locais mediante, por exemplo, neuroestimulação elétrica transcutânea (transcutaneous electrical nerve stimulation), compressas quentes e acupuntura, também demonstrou ser efetiva de acordo com pequenos estudos realizados.
Se os antiinflamatórios não-esteroidais não dão resultado, geralmente usam-se anticonceptivos orais combinados para inibir a ovulação e suprimir o crescimento endometrial. Sendo que mantém o estado endócrino da fase de proliferação anterior, este enfoque também diminui os níveis de prostaglandina. Podem ser necessárias progestinas contínuas (orais, intramusculares ou mediante um dispositivo intra-uterino), a fim de induzir a ausência de ovulação em casos resistentes ao tratamento.
Se bem que os derivados dos andrógenos (danocrina) também induzem a ausência de ovulação, seus efeitos secundários virilizantes graves os fazem menos atrativos.
Em casos mais graves, deveriam considerar-se tratamentos breves com opióides para manejar os ataques de dor.
Deveria reservar-se a cirurgia de extirpação (extirpação laparoscópica de lesões por endometriose ou leiomioma) só para o caso que o anterior não dê resultado, enquanto que os procedimentos de destruição de nervos só devem ser utilizados com precaução.
Ainda que os ensaios controlados aleatoriamente demonstrem que a neurectomia pré-sacra é um tratamento efetivo para a dismenorréia, este procedimento ocasiona o risco de provocar efeitos secundários viscerais permanentes.
Copyright International Association for the Study of Pain, September 2007. References available at www.iasp-pain.org